Percevejo pode ser um dos principais vilões dos produtores de sementes

É possível que pequenos ataques do inseto inviabilizem o vigor e a germinação do produtoAs sementes são altamente valorizadas e envolvem muitos cuidados na hora da produção. O maior drama provocado pelo percevejo atinge os produtores de semente. É porque qualquer picada do inseto pode inviabilizar o vigor e a germinação da semente. Os sementeiros buscam métodos de evitar os danos causados pelo inseto.

O laboratório da Associação dos Produtores de Semente de Mato Grosso (Aprosmat) realiza exames e testes para verificar a qualidade da semente que será comercializada para os produtores do Estado. O sementeiro precisa estar convicto de que seu material vai oferecer uma plantação de qualidade ao produtor. Veja os principais pontos analisados.

– O primeiro é o padrão de pureza, que vai ser determinado verificando se a semente foi prejudicada mecanicamente por colheitadeira ou por máquinas, exatamente qual a porcentagem. Depois, tem que saber exatamente quando essa semente vai germinar. Você tem que saber qual é o vigor da semente. Depois, o fator externo, o ataque de percevejo, por exemplo, que hoje está com um problema mais grave nas lavouras. Qual que é a porcentagem da semente que passou para o ataque de sementes, que é a incidência ao ataque do percevejo, o que ele pode prejudicar, eventualmente, na qualidade da semente e para o agricultor que vai plantar ela. É isso que o laboratório determina hoje – orienta Pierre Patriat, vice-presidente da Aprosmat.

Quando leva a semente ao laboratório, o produtor quer apenas obter uma confirmação do que já esperava.

– Na realidade, o que ele faz? Ele está aqui muitas vezes para confirmar algo que ele já sabe. O laboratório vai dar uma indicação: 3% de ataque não vai ter interferência na produtividade, 5% já pode ter interferência, 10% praticamente inviabiliza. O laboratório não tem nome e não existe lei para proibir. O que eu falo é que o mercado é soberano, nenhum produtor vai querer oferecer uma semente de qualidade inferior para depois perder o cliente. Então, na verdade, ele vem para confirmar se realmente o cultivado dele está em boas condições para ser usado no plantio comercial – segue.

Quando observamos o laudo, vemos que o percentual comprometido aparece.

– Sim, aparece a porcentagem. Muitas vezes, a severidade vai depender de onde foi o ataque, em que parte da semente foi a picada do percevejo. O embasamento para o produtor diz que este lote está condenado, esse grão não vai poder passar, e é uma base para ele comercializar – completa Patriat.

Não existe barreira oficial, mas ninguém vai querer vender uma semente que não germina. Então é o próprio mercado que regula essa questão.

– Se vender uma semente ruim, você vai perder o cliente. O mercado é soberano – reforça.

A Aprosmat faz 18 mil análises de sementes a cada safra, em média. Os analistas vêm percebendo um aumento preocupante nos danos causados pelo percevejo, especialmente nas cultivares mais tardia.

– O que nós percebemos é que o ataque do percevejo está conforme o ciclo cultivado. O ciclo precoce, o ciclo médio, de modo geral, não tem problema. O ciclo mais tardio, aquele que vai colher mais para frente, é quando o percevejo está migrando de uma lavoura para outra, ficando mais difícil combater. O problema é que temos poucos produtos para combater e que, geralmente, não são para ciclo tardio – comenta o vice-presidente da Aprosmat.

Às vezes, a soja que não tem condições de ser comercializada como semente, ela pode ser vendida como grão. Mas o que se perde, ainda na lavoura, é muito mais.

– O grão que tem ataque de percevejo tem certa qualidade, a não ser que o ataque seja muito severo. Falando comercialmente, uma lavoura que sofre um ataque muito severo de percevejo, os grãos que foram atacados não são mais grãos, eles vão ser descartados na colheitadeira, no sistema de limpeza e ventilação e vai jogar esse grão no chão. O percevejo retirou a parte nutritiva do grão, e ele perde peso. É o que eu chamo de perca invisível. De repente, esse grão que foi comido ao extremo vai ser jogado na palha e você não o soma à sua produção – ressalta Pierre Patriat.

Para a realização dos testes, o laboratório usa, no mínimo, o padrão do Ministério da Agricultura.

– Nós fazemos a verificação de acordo com as regras solicitadas pelo Ministério da Agricultura, fazemos oito repetições em 50 sementes. Nós fazemos o papel germiteste e umedecemos o grão, fazendo oito repetições em cada lote. Depois dessas oito repetições, nós levamos cinco dias nos germinadores para efetuar a leitura – explica Roberta Kiodi, supervisora do laboratório da Aprosmat.

As análises começam pela visualização da aparência externa do grão e, em seguida, vai para o teste com sal do tetrazólio, que analisa o possível dano do percevejo no interior da semente.

– Ele é considerado um raio-x que nós conseguimos fazer dentro da semente de soja. Quando conseguimos visualizar os danos mecânicos, danos por umidade e danos por percevejo, que são danos que causam a redução da qualidade da semente. Ele é feito em um período de 16 horas de condicionamento, após isso a gente coloca numa estufa à 40º e, com o tetrazólio, que é um líquido que a gente coloca e é incolor, ele vai realçar as enzimas e vai penetrar nos tecidos vivos da semente e vai causar coloração vermelha, onde a gente consegue visualizar os danos existentes dentro da semente, que são dados por notas. De 1 até 8 são sementes viáveis e não viáveis. No geral, o dano do percevejo pode ser muito grave, mas não tira o vigor da semente, desde que o produtor tenha controlado corretamente na lavoura – comenta a analista de sementes Valéria Martins.

Outo teste realizado é o do poder de germinação. É neste momento, com as sementes já germinadas, que se tem uma ideia de como está o lote do ponto de vista de estrutura da planta.

– O teste de germinação vai avaliar como que estão todas as estruturas necessárias para gerar uma planta no campo. A gente faz uma avaliação, verifica se todas as sementes geraram alguma coisa que tenham estrutura e selecioná-las como normais e contabilizar, fazendo uma análise quantitativa e vamos descriminar isso, com quantidade de sementes normais e quantidade de sementes anormais – orienta Ana Aurélia Dias Oliveira, analista de sementes.

Neste exemplo que a Ana Aurélia está falando não foram localizados danos fatais de percevejos.

– O percevejo pode aparecer em toda a estrutura onde ele estiver localizado. Eu tenho o exemplo de uma planta normal e que ela tem toda estrutura, mas eu tenho uma necrose causada pelo percevejo na parte aérea, mas não inviabilizou a germinação dela. Ainda gera uma planta que vai gerar uma planta, só que está um pouco comprometida na reserva, mas ela tem as outras estruturas normais – pondera Ana Aurélia.

Armadilha de feromônios

A Fundação MT desenvolveu uma nova armadilha para o monitoramento do percevejo,. A pesquisadora Lúcia Vivian, especialista em entomologia, estuda diversas influências dos insetos na produtividade das lavouras e, também, as metodologias de monitoramento e controle. No caso do percevejo, o monitoramento deve ser feito sempre, desde o estágio vegetativo.

– Às vezes, nesse período ou em algumas situações, a gente não encontra o percevejo marrom, que acaba sendo o nosso principal foco, e em algumas áreas, dependendo do ano ou até da localização da área, principalmente se for próxima ao serrado, pode ter uma população presente deste percevejo já no vegetativo. Apesar de ele não estar causando dano na cultura, ele pode ter uma população considerável nesta área. Se ele retardar muito essa aplicação ou se ele não for nessa área e não ver a presença do percevejo, ele pode ter erros principalmente na primeira aplicação, no primeiro controle e, com isso, vai desencadear um problema e, muitas vezes, ele não vai conseguir mais reduzir essa população porque no início da R3 já podem ocorrer as ovo posições – explica a pesquisadora da Fundação MT Lúcia Vivan.

É necessário controlar, mas sempre fazendo o monitoramento antes para não fazer uma aplicação desnecessária.

– Ele já vai ter a presença de ovos, de ninfas e aí já tem uma geração praticamente implantada na área. Com o objetivo de reduzir essa primeira colonização e até conseguir um residual melhor desses produtos, a gente indica que, se tiver a presença desses dois percevejos por metro, no caso de uma lavoura de grãos, ou um percevejo por metro no caso das sementes, a gente indica a pulverização, no vegetativo, mas é importante que ele tenha esse monitoramento. Ele não pode simplesmente aplicar e achar que tem essa população, porque tem ano que tem e tem ano que não tem. Os talhões são bastante diversificados – analisa Lúcia.

A pesquisadora da Fundação MT confirma que o maior problema na região é a soja tardia.

– A soja tardia vai estar em um período vegetativo quando os outros já estão colhendo ou entrando em processo de amarelecimento. Principalmente os adultos vão migrar para as outras áreas. A soja que está para colheita ou em processo de amarelecimento terá uma presença grande de ninfas que causam problema da mesma forma que um adulto, mas que não migram para as outras áreas. Elas vão ficar nessas áreas até serem colhidas, mas os adultos vão migrar e iniciar uma ovo posição, pois eles já são insetos da safra – explica.

A Fundação MT está testando uma espécie de armadilha com feromônios para controlar a presença do percevejo marrom nas plantações. O estudo é uma parceria com a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Embrapa Cernagen) e conseguem um monitoramento mais fiel à realidade do talhão.

– Temos uma parceria com a Embrapa Cenargen, que está desenvolvendo um feromônio para o percevejo marrom. Há três anos que estamos com essas armadilhas no campo e observando como é a captura. Fizemos outros ensaios para ter uma população para correlacionar com o nível de dano. Se chegou a 1,7 percevejos na média das armadilhas, o que valeria a dois percevejos por metro, no caso de grãos, para iniciar e realizar o controle sem danos. Nós fizemos esses trabalhos e conseguimos identificar essa população até um ano, e essa população atingiu o nível nos feromônios praticamente um mês antes do que em relação ao pano de batida. Isso é muito importante e nessa área a gente conseguiu um dano menor e produções maiores. As aplicações foram deslocadas em relação onde o produtor não tinha armadilhas e só monitorou com o pano – comenta Lúcia Vivan.

A armadilha é simples, feita com garrafa pet. A entidade está estudando uma forma de reproduzir o feromônio para distribuir aos produtores.

– Ela é uma ótima ferramenta para monitorar essa população. Lógico que, a partir do momento que o inseto coloniza a área, é preciso realizar o pano de batida porque eu vou ter uma população de ninfas que vão ocasionar o dano. Elas não serão detectadas pelo feromônio e sempre a planta tem uma atração maior do que o feromônio. Num primeiro momento, a gente consegue ter essa migração da população por meio do monitoramento pelo feromônio – indica.

Trabalho conjunto contra a praga

Há um trabalho desenvolvido pela Associação de Produtores de Sementes da Serra da Petrovina, com apoio do Instituto Mato-grossensse do Algodão (IMA). Eles se uniram para não permitir a entrada e a proliferação do percevejo. Na região, é produzida mais da metade das sementes de soja plantadas em Mato Grosso. Por isso, o controle tem que ser para todos, evitando a migração.

– O percevejo, por ser uma praga migratória, exige um controle em conjunto que é o controle regional. Todos têm que fazer esse controle juntos, porque não adianta eu fazer o controle na minha propriedade e o vizinho na fazer na área dele. Esse percevejo vai acabar migrando e vai me trazer problema. Com o custo maior de produção e, consequentemente, um dano maior, correndo o risco de perder talhões por dano do percevejo – ressalta o gerente da Fazenda Girassol, Alessandro Dalazén.

Como você já viu no Qualidade de Grãos, o percevejo causa mais prejuízos ao sementeiros do que ao produtor comum.

– O percevejo seria a principal praga hoje para que a produção, principalmente a partir da fase reprodutiva, a partir do R3 até a maturação fisiológica desses grãos. Tem que ter cuidado porque o dano causado por ele pode inviabilizar essa qualidade de semente, inclusive até matar o embrião da semente. A preocupação nossa com o produtor da semente é trabalhar com alguns índices de controle mais baixos. Por exemplo, a gente monitora a cada três dias o campo e, a partir do momento que atingir um nível de meio percevejo por metro, entramos com o controle, geralmente o químico – explica.

Além do controle químico, a fazenda utiliza manejos que colaborem com a redução da população.

– A gente tem trabalhado com a rotação de cultura, com controle efetivamente funcional e rotacional. A gente faz o controle dos restos culturais e isso faz diferença. A gente já fez avaliações em anos que não fizeram esses controles corretamente e houve um aumento de população, trazendo transtorno e um custo a mais para tirar essas sementes com a qualidade exigida. O percevejo é um divisor de águas com relação a qualidade da semente, então o percevejo não pode entrar de jeito nenhum porque ele vai ser limitador da qualidade final dessa nossa semente – comenta Dalazén.

Antes de começar a colocar as máquinas para colher, os técnicos fazem uma pré-colheita e mandam as amostras para análise no laboratório. Desta forma é possível definir se daquele talhão sai grão ou semente.

– A gente faz um teste antes, até porque tem toda uma logística de sementes, que é diferente do grão e temos que estar com essa resposta antes. Porque a regulagem e a colheitadeira são diferentes, você precisa regular um pouco mais porque a gente não pode ter o risco de dano mecânico porque a regulagem é um pouco diferente da colheita de grão. É muito importante a gente ter esse resultado antes da colheita, porque tomamos a decisão se vamos colher a semente ou não – pontua.

E o dano do percevejo ele está nesse calculo.

– Além do dano do percevejo, o dano da umidade, vamos dizer assim que não só para o dano do percevejo causa perda, descarte de semente, mas danos por umidade, também. O percevejo é um dos danos que também é indicado por este teste – afirma.

E para finalizar, um recada aos produtores: é preciso fazer as contas para garantir uma boa produção e sem gastar demais.

– A avaliação do custo da aplicação é assim: atingir o nível de dano, se você não encontra com o controle imediato, corre-se o risco de ter esse talhão descartado pelo dano da praga. Tem aplicações que vão variar de R$ 20,00 até R$ 100,00. Ela tem que ser feita porque não se pode correr o risco de perder a lavoura. Você cuida da lavoura durante todo o ciclo e, às vezes, em função de tomar uma decisão errada, você pode ter essa lavoura descartada.As avaliações e as decisões devem ser tomadas quando necessário, sim – completa o gerente da Fazenda Girassol.