Entidades alertam que falta estrutura nos Estados para regularização ambiental das propriedades

Poucos Estados adequaram suas legislações ao novo Código Florestal e nenhum tem recursos exclusivos para a validação do CARCom dois anos de atraso, o governo federal publicou no início deste mês o decreto que faltava para iniciar o prazo obrigatório para os produtores fazerem a regularização ambiental de suas propriedades. Mas isso não significa que todos os problemas estão resolvidos. Pelo contrário, a regularização ambiental dos imóveis rurais depende também da estrutura dos Estados. E a maioria deles está longe de conseguir dar conta do recado.

Essa é a conclusão do primeiro levantamento realizado pelas organizações da sociedade civil que participam do Observatório do Código Florestal. Nessa sexta, dia 23, elas se reuniram em São Paulo para avaliar os dois anos da nova lei. De acordo com o levantamento, até agora os Estados do bioma Amazônia são os que mais avançaram na implementação do Código e do Cadastro Ambiental Rural (CAR).

O decreto de regulamentação do CAR, que foi publicado no dia 5 de maio, determina que as propriedades que tiverem menos reserva legal ou áreas de preservação permanente devem aderir ao Programa de Regularização Ambiental (PRA). É a partir deste ponto que começa o trabalho dos Estados.

O desafio é adequar as legislações florestais estaduais ao Código de 2012 e validar os cadastramentos realizados, ou seja, conferir se as informações estão corretas e fazer os acordos de regularização para quem tem passivo.

Além do trabalho dos governos e Assembleias Legislativas para atualizar as legislações estaduais, é preciso que as Secretarias de Meio Ambiente ou da Agricultura tenham pessoal técnico capacitado para validar e monitorar a execução dos planos de recuperação ambiental. Os Estados têm, ainda, a obrigação de ajudar os pequenos agricultores, aqueles com até quatro módulos fiscais, a fazerem os seus cadastros.

Compasso de espera

Os participantes do evento desta sexta relatam que a maioria dos Estados fora da Amazônia não possui nenhum imóvel cadastrado. Espírito Santo é uma das exceções, dos seus 310 mil imóveis rurais, cerca de 6.500 estão cadastrados, sendo quatro mil destes validados.

São Paulo, um dos primeiros a desenvolverem seu sistema próprio de CAR depois de 2012, tem cerca de sete mil, de um total de 300 mil propriedades, com o cadastro feito. Segundo Roberto Resende, presidente da organização Iniciativa Verde, a maioria grandes e médias propriedades.

– A estrutura nos preocupa. A Secretaria de Meio Ambiente não tem técnicos suficientes para esse trabalho e não estamos vendo o envolvimento da Secretaria de Agricultura e das prefeituras.

Resende diz que o gargalo no Estado será o cadastramento de cerca de 200 mil pequenas propriedades que não estão sendo priorizadas pelo governo. Além disso, São Paulo não validou nenhum dos cadastros já feitos, tampouco atualizou a sua legislação estadual.

– São Paulo poderia ter feito mais, avançado melhor na definição de suas diretrizes, mas ficou dois anos em compasso de espera, aguardando o decreto federal que saiu neste mês – aponta Resende.

Esse compasso de espera parece ter marcado a situação da maioria dos Estados.

– Os Estados poderiam ter aproveitado estes dois anos para se organizarem, planejarem a contratação de técnicos e estarem mais preparados para este momento – considera também Gabriela Savian, da Conservação Internacional.

Amazônia

A Conservação Internacional é uma das organizações que está acompanhando a implantação do Código Florestal de 2012 no bioma Amazônia. De acordo com o levantamento coordenado por Gabriela Savian, apenas Acre, Tocantins e Rondônia já adaptaram a legislação dos seus Estados ao Código. Destes, somente Acre e Rondônia foram adiante e regulamentaram o PRA.

Outros três Estados já tinham um sistema de cadastro ambiental – Amazonas, Mato Grosso e Pará, e os dois últimos são os que mais avançaram no cadastro e validação dos imóveis. Ainda assim, falta aos três equiparar suas leis e regulamentações às novas normas federais. Amazonas, Maranhão e Roraima estavam parados até agora, esperando o decreto federal publicado neste mês. E o mais grave: nenhum dos nove Estados da Amazônia destina recursos exclusivos para o CAR.

– Agora os Estados estão fazendo a mobilização para cadastrar principalmente as pequenas propriedades, que são sua responsabilidade. Rondônia, por exemplo disponibilizou um 0800 para tirar dúvidas. Muitos têm balcões de atendimento nas prefeituras e sindicatos. Mas todos estão focados na inscrição, sem criar estratégias para a validação – avalia Gabriela.

Alerta

A falta de estrutura dos Estados pode comprometer um dos benefícios que o Código Florestal de 2012 traz para os produtores que têm passivo. De acordo com a lei, quem tiver menos reserva legal do que o necessário e não puder recuperar áreas dentro de sua propriedade, pode compensar comprando cotas de reserva ambiental em outras propriedades. Mas, para isso acontecer, os cadastros precisam ser validados.

– Para a emissão da cota de reserva ambiental, o CAR tem que ser validado e a propriedade ,vistoriada. E a estrutura dos Estados hoje é realmente um entrave para a realização das cotas – aponta Roberta Del Giudice, da Bolsa Verde do Rio (BVRio).

Para o mercado de cotas de reserva ambiental valer, o governo federal ainda precisa publicar um decreto de regulamentação específico. Roberta aponta outra oportunidade de compensação, mais rápida, pois já está regulamentada: a compensação em unidades de conservação. O Código Florestal permite que um proprietário com déficit de reserva legal compense comprando essas áreas que precisam ser desapropriadas dentro dos parques.

Pelos cálculos da BVRio, se todas as 16 milhões de propriedades existentes dentro de parques nacionais e outras áreas protegidas fossem utilizadas nesse método de compensação, se geraria uma economia de R$ 15 bilhões para o governo federal. Mas, para isso, quem precisa regularizar sua reserva legal precisa ter o CAR validado pelo governo do seu Estado.

• Quer saber tudo sobre o Código Florestal? Acesse nosso blog