Agricultura

Anvisa diz que glifosato não causa câncer, mas sugere restrições para uso

Agroquímico é o mais utilizado no Brasil, com mais 173 mil toneladas comercializadas em 2017; produto também é utilizado em jardinagem amadora

glifosato bayer
Foto: Formad/divulgação

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concluiu o processo de reavaliação toxicológica do glifosato no Brasil que havia sido iniciado em 2008. Segundo a relatora, Alessandra Soares, o ingrediente não apresenta capacidade de causar câncer, mutações genéticas, má formação ou alterações em fetos durante a gravidez, mas por causa do potencial de ocorrência de irritação ocular ele será classificado na Classe 1 como extremamente tóxico.

O estudo da agência também destaca que o risco de contaminação por meio da água ou dos alimentos é extremamente baixo. Já as análises de intoxicação de trabalhadores rurais e moradores de áreas próximas a lavouras que recebem aplicações do defensivo levaram o órgão a sugerir novas restrições na forma de uso do agrotóxico. O relatório foi apresentado na manhã desta terça-feira, dia 26, em reunião da Diretoria Colegiada. Agora, ele será submetido à consulta pública pelo prazo de 90 dias até ser votado pelos diretores.

“A Anvisa reavaliou e concluiu que quanto às propriedades proibitivas de registro, o glifosato não apresenta características mutagênicas, teratogênicas e carcinogênicas. Não é desregulador endócrino e não é tóxico para a reprodução. Não há evidências científicas de que ele causa mais danos à saúde que os testes com animais em laboratório puderam demonstrar”, pontuou a diretora relatora, Alessandra Soares.
A relatora ponderou que o glifosato é o ingrediente ativo mais utilizado no Brasil, com mais 173 mil toneladas comercializadas em 2017. Além do herbicida usado no campo, é utilizado em produtos de jardinagem amadora.

Quanto à saúde humana, a relatora destacou que “a avaliação do risco dietético mostrou nível seguro de exposição sem extrapolação das doses” e que “estudos de monitoramento demonstram ausência de risco por exposição dietética, inclusive por lactantes”.

O relatório será submetido à consulta pública na qual a sociedade poderá contribuir com sugestões em relação às modificações propostas pela agência quanto ao uso do glifosato no Brasil. Depois de 90 dias, a diretoria da Anvisa se reunirá para votar e definir os novos parâmetros para a utilização e comercialização do defensivo no país.

Novos parâmetros

Após as avaliações, a Anvisa quer novos parâmetros de referência para avaliação de risco do glifosato: ingestão de ar aceitável igual a 0,5 mg por kg por dia; dose de referência aguda de 0,5 mg de kg por dia; nível aceitável de exposição ocupacional 0,1mg por kg por dia.

No relatório que ainda vai à consulta pública, a agência pede a proibição de produtos de jardinagem amadora à base de glifosato com concentração superior a 1%.

A relatora destacou a necessidade de edição de medidas de mitigação para maior segurança das pessoas que têm contato com o produto, como informações específicas na bula e na monografia dos defensivos formulados com o ingrediente. “As intoxicações agudas não causam sequelas, mas o coeficiente de letalidade é alto”.

Relatório

Durante a reunião da manhã desta terça-feira, o técnico Daniel Roberto Coradi, da Gerência-Geral de Toxicologia (GGTOX), expôs dados do estudo feito ao longo dos últimos anos. Nas avaliações de água, 26,8% continham resíduos do glifosato, mas apenas 0,03% estavam acima do limite. “A contaminação de água pelo glifosato é extremamente baixa, muito improvável de ocorrer”, justificou.

Em relação aos alimentos, foram analisadas 906 amostras de arroz, manga e uva e não foi encontrado risco.
“A área conclui que o glifosato não representa risco dietético agudo ou crônico”, apontou.
Em relação à intoxicação direta pelo produto, a Anvisa analisou casos entre 2007 e 2015 de trabalhadores rurais, aplicadores de agrotóxicos e moradores de áreas próximas às lavouras.

No período, 40% dos relatos foram de tentativas de suicídio com ingestão do glifosato. Outros 27,9% foram notificações de exposição ao defensivo, mas sem sintomas aparentes. A agência excluiu esses processos da analisa e traçou o perfil em cima de 800 modificações, cerca de 37,1% do total.

A Anvisa analisou que o perfil epidemiológico das pessoas que se intoxicam são trabalhadores rurais que atuam principalmente em períodos chuvosos, justamente quando aumenta a frequência de uso do produto. A maioria dos casos ocorrem durante o período de trabalho, principalmente na pulverização, e a cultura com mais ocorrência é a do café.

Medidas de mitigação

O técnico explicou algumas medidas de mitigação de risco propostas pela agência. A principal delas é melhorar a forma de comunicação e as campanhas sobre utilização correta do produto. Isso porque a maioria dos contaminados são homens e 63% nem completaram o ensino fundamental.

Para o trabalhador que aplica o glifosato, a Anvisa quer mudar as regras para o limite máximo de exposição . “Para aplicação em trator, o mesmo indivíduo não pode fazer atividade de mistura, abastecimento e aplicação. Precisa ser feito por mais de uma pessoa, mesmo com uso de EPI completo”, alertou a agência.

Para proteger transeuntes, moradores de áreas próximas à aplicação do defensivo e demais público em risco, a agência deve de a proibição de produtos que dependa da dissolução em água. Três produtos tem esse tipo de formulação no país atualmente.

Nova call to action

A Anvisa quer que os produtores se adaptem para reduzir drasticamente o espalhamento da nuvem de agrotóxicos gerada na aplicação. “Se usar aplicação em trator redução tem que ser de 50% a redução . Isso não é inviabilidade pro uso, segundo conversas com o Ministério da Agricultura, é uma prática aceitável. No uso manual, a redução deve ser 20% ou a proibição de taxas superiores a 2.3”, afirmou Coradi.

“Isso garante que os moradores não serão intoxicados. Se houver moradias, vilas, escolas isoladas a menos de 500 metros do limite externo da plantação, o produtor deve guardar área de segurança, 10 metros livres da aplicação para segurança dos demais”, disse.

Uma das medidas mais duras é a alteração da classificação toxicológicas do glifosato para a Classe 1, como extremamente tóxico. “Ele causa irritação ocular e isso deve colocá-lo como extremamente tóxico.

Identificamos que, por causa do risco de irritação ocular, não pode ser permitida manipulação e deve ter 1% de concentração no máximo. Proibição da comercialização de produtos na modalidade amadora dose única para que se deixe de vender produtos que possam ser manipulados. Os produtos devem ser vendidos prontos para uso”.

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